sexta-feira, 14 de junho de 2013

Irracional é protagonista na revolta dos R$ 0,20 por Josias de Souza


 "Nina Cappello, estudante de direito, tida como uma das “organizadoras” do Movimento Passe Livre já havia lavado as mãos há três dias: “A gente não tem controle. Ficou claro que a manifestação se transformou numa revolta popular na cidade contra o aumento da tarifa.” Na noite passada, Lídio Costa Júnior, major da Polícia Militar, enxaguou as mãos “Não nos responsabilizamos mais pelo que vai acontecer”.
Entre a falta de controle da turba e a ausência de responsabilidade da farda, o irracional tornou-se o ator principal do espetáculo transmitido ao vivo das ruas centrais de São Paulo para os lares de todo país. Em meio à bruma do spray de pimenta, a euforia do quebra-quebra misturava-se à excitação dos tiros de borracha. Os dois lados pareciam ter ciência de que preparavam um noticiário fantástico.
Era como se ditassem para o William Bonner um par de destaques para a escalada de manchetes do Jornal Nacional. Era como se redigissem a capa dos jornais da manhã seguinte. Rodavam uma espécie de filme de ação sem autor nem diretor. Depredavam e lançavam bombas de gás porque seguiam orientações e cumpriam ordens. Orientações do Tinhoso, ordens do Todo-Poderoso. E vice-versa.
Exceto pelos sublevados que não têm cara de quem anda de ônibus, manifestantes e soldados formam uma irmandade feita da mesma matéria prima. Não têm razão para sentir raiva um do outro. Provavelmente moram nas mesmas submoradias, comem o mesmo pão que Asmodeu amassou.
Suprema ironia: quando o prefeito era de outro partido, o PT estimulava o Movimento Passe Livre.
Agora, o prefeito é petista. Cúmplice nos reajustes, faz coro com o governador tucano: não há como cancelar. E a turma que dirige o próprio carro se horroriza com a revolta que um reajuste de R$ 0,20 pode causar. Que horror, que horror!
Por sorte, a rebelião teve um desses momentos que o doutor Luís Roberto Barroso, novo ministro do STF, chamaria de ponto fora da curva. Protagonizou-o o policial militar Wanderlei Paulo Vignoli. Montava guarda no prédio do Tribunal de Justiça de São Paulo quando notou que um sujeito pichava o bem público. Tentou impedir. Súbito, viu-se cercado por duas dezenas de manifestantes.
Apedrejado na testa, sangue a escorrer pelo rosto, recolheu os ruídos que soavam ao redor: “Lincha, lincha. Tira a arma dele. Mata!” Sacou o revólver que trazia na cintura. Estava carregado com balas letais, não de borracha. Por que não atirou? “Somos treinados para manter o autocontrole, só atirar no limite. Entendi que, mesmo tendo sido atingido com pedradas, não era o limite para usar arma de fogo.”
Vignoli anda de ônibus e de metrô. Quando não está fardado, desembolsa a tarifa que passou de R$ 3,00 para R$ 3,20. Informado de que os rebeldes pedem tarifa zero, o policial fez cara de riso. “Eu também gostaria, né? Mas acho que nem os países de Primeiro Mundo chegaram a esse patamar.”
Segurança do Tribunal de Justiça, Vignoli conta que o prédio acaba de passar por uma restauração milionária. “Eles têm que entender que esse dinheiro [para apagar a pichação] vai sair do bolso da população.” A realidade brasileira por vezes fica inacreditável. Mas quando se imagina que tudo está perdido, o sujeito que segura o revólver demonstra que é possível ter razão disparando apenas argumentos."

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